segunda-feira, abril 04, 2011

Meu querido, meu velho, meu amigo

"Seu passado vive presente nas experiências
Contidas nesse coração, consciente da beleza das coisas da vida..."
Meu querido, meu veho, meu amigo
(Roberto carlos)


A vida da gente é feita da participação de pessoas. Pessoas que convivemos, que amamos, que aprendemos a gostar. Ninguém vive uma vida sozinho. E as lembranças que ficarão são de momentos compartilhados, sorrisos espelhados no olhar de alguém. É isso que faz a diferença nesse mundo de Deus. É justamente isso que a nossa memória vai guardar a sete chaves. A imagem, o sabor, a sensação. O cheiro de alguém ou de alguma coisa que em um determinado minuto nos fez sentir mais vontade de viver. Não sei o que dizem os especialistas, mas acredito que uma lembrança, mesmo que desbotada, pode reproduzir uma sensação. Aquela mesma que você sentiu anos atrás, ou até quando era tão pequeno que já nem lembra direito. Porque tudo que vemos, ouvimos, sentimos fica guardado em algum lugarzinho na nossa mente, e de brinde fica também as emoções.

Lembro com carinho do meu avô. Hoje quero falar dele. Das recordações que carrego comigo. Do cheiro forte do leite de rosas que ele usava desmedidamente. Dos seus cabelos brancos, fininhos, bons de passar a mão. Meu avô era um homem grande, não só nos seus 1,90 aproximadamente, mas ele era grande no coração. Era um pai cuidadoso, e isso eu digo sem ter visto a sua labuta em criar seus nove filhos, num lugar onde só tinha o chão pra plantar. Mas isso ele aprendeu, e fazia bem. Foi um agricultor durante a maior parte de sua vida. Conheço várias histórias que minha mãe e tias contam sobre aquele tempo "difícil", sem grandes recursos materias, mas pelo brilho no olhar, acredito, foi uma época feliz. 

Mas tambem não quero falar do que não vivi, quero falar das mãos grandes que o meu avô tinha. Eram enormes, mesmo quando as minhas já não eram tão pequenas. Lembro da mania que ele tinha em mascar seu fumo depois do almoço. De quando trazia na cabeça melancia da feira aos domingos. Lembro do seu abraço trêmulo. Do seu sorriso preto do fumo. Do seu bom humor. Das brincadeiras com a Maria dele, minha avó, sabendo ele que ela não gostava nem um pouco delas. Das suas histórias do passado contadas naquela calçada, em sua cadeira de balanço. Da sua generosidade ao me dar as pratinhas que eu sempre pedia, talvez por mero prazer em receber dele. Lembro de como eu gostava de enchê-lo de beijos só para ver sobressair seu sorriso largo.

Lembro de quando meu avô ficou doente. De quando toda noite íamos comprar coca-cola para aliviar aquela coisa presa que ele sentia dentro dele. Eram suas veias congestionadas, depois decobrimos. Sofria do coração. Foi um momento difícil pra toda a família. Mas com o apoio e união de todos, meu avô superou uma cirurgia complicada, e viveu ainda muitos anos, claro, sob as rédeas curtas da minha avó. Dieta controlada, fumo uma única vez ao dia, já que não tinha como tirar isso dele, e nada de peso, nada de melancia na cabeça ou qualquer outra estripulia. 

Mesmo assim, ontem, dia 04.04, fez sete anos que meu avô partiu, descansou quando já não tinha mais forças. Morreu sem querer morrer. Tinha amor a vida, e a sua familia. Lembro que ele dizia já perto de sua ida que não podia morrer porque tinha a sua Maria e seus filhos e netos. Ele se sentia responsável por todos, tinha ainda muito o que fazer por aqui. Mas ele se foi. E hoje vive na mente e nos corações dessa família que ele tanto quiz proteger. Ele é memória, e é amor.